26.6.09

Há coisas que, provocam em mim um imenso desejo de escrever. Só que é nessas maravilhosas coisas que eu perco o meu raciocínio. Não sei, é como se o meu cérebro congelasse... O teu olhar provoca-me isto. Odeio quando acontecesse.

24.6.09

Hoje dispensei cinco minutos da minha ocupada vida para reflectir um bocado. Já não o fazia à algum tempo. E consegui ter a pequena noção de que a minha vida está um caos. Não percebo por que é que me queixo que não tenho tempo para nada... Não sei à quanto tempo é que não limpo o meu quarto. Começei a observar a minha mesa de cabeçeira, até que decidi passar lá o dedo; nela só se constatava pó. Há duas semanas que tenho uma pilha de roupa para arrumar, mas não o faço porque as minhas gavetas estão um nojo. Há meses que não dispenso mais de quatro horas para ler. Não tenho ouvido música. Não tenho fotografado. Olhei para o tecto e consegui visualizar várias teias de aranha... Ando mesmo sem noção de tempo. No fim de este desabafo todo, ainda não consegui compreender onde é que gasto tanto tempo de uma forma completamente fútil.

16.6.09

Hoje todas as pessoas são feias.

3.6.09

O livro de Ângela



I

Como Ângela fugiu aos ruidosos festejos dos primos pela chegada das férias e, no meio das atribuladas aventuras do seu livro preferido, adormeceu.

II

Quando o sino da torre anunciou solene a sua voz, o cuco, que também dormia, acordou em alvoroço e com o seu canto mavioso repetiu as horas no relógio do quarto.
Mas nada podia despertar Ângela daquele sonho com um endiabrado "pedaço de madeira que ria e chorava como uma criança" - história que ia já muito adiantada.


III

«Nunca se sabe o que nos pode acontecer neste mundo. Já se viu tanta coisa!...», repetia o velho, incrédulo perante o espectáculo daquele «boneco maravilhoso que sabia dançar, fazer esgrima e dar saltos mortais. Com ele correria mundo para granjear um naco de pão e um como de vinho.»

IV

- Quem sou?
Porque me fizeste regressar da terra das sombras?
Se todo eu sou obra tua, Pai, aquilo que eu sou não é meu.
Tenho que procurar o que me pertence.


A figura parecia crescer de confiança em si neste conforto com o velho quando, de dentro do espelho, um outro igual a ele, estendendo-lhe um cigarro, lhe disse «a tua boca quer sorrir, mas o teu olhar treme.»
- Não penses mais!
- Fuma!


V

«"Que pessoas tão boas!"» pensou; e, esquecendo-se imediatamente do pai e de todos os bons propósitos que fizera, disse à raposa e ao gato:
- Vamos já embora; eu vou com vocês.»

VI

«...quem nos quiser que nos venha colher.»

«...e entre contínuo folguedos e divertimentos vários, as horas, os dias e as semanas passavam sem se dar por isso.»

VII

«Aquele dia prometia ser mais um dia bonito e muito alegre (...) mas infelizmente, na vida dos bonecos, há sempre um mas que estraga tudo.»

VIII

E enquanto lhe parecia ouvir, ao longe, uma música de pífaros e toques de tambor, dentro dele a música era outra.
Ouçamo-la: «Bom, a minha Consciência pendurada ao pescoço do meu coração diz-me muito sabiamente: "meu honeste amigo, sendo filho de um homem honesto - porque, de facto, o que o meu pai fez foi outra coisa esperta, fez uma coisa crescer, tinha um certo gosto"» - não te demores em diverssões com companhias duvidosas. Corre, que o teu pai está em grande aflição pelo teu desaparecimento.
- Não corras! Ainda há tanto para ver, «diz-me p Diabo que tenho sentado sobre o ombro.»
- Vai imediatamente.
- Não vás! Ainda há tanto para fazer.
«A minha Consciência é severa a oferecer-me conselhos, mas o Diabo dá o conselho mais agradável.»
- Bem, vou abraçar meu pai depois, agora quero ver as máscaras de Grande Teatro de Fantoches.
«A minha curiosidade e os meus sentidos estão às tuas ordens, cardo Diabo.»


IX

«-O que queres de mim? - disse o boneco.
- Quero dar-te um conselho: se queres ser um rapazinho volta para casa - respondeu-lhe uma vozinha muito fraca que parecia que vinha de outro mundo...
(...)
- Mas eu quero seguir em frente.
- A hora é tardia!...
- Quero seguir em frente.
- A noite está escura!...
- Quero seguir em frente.
- A estrada é perigosa!...
- As histórias do codtume. Boa noite!
- Boa noite e que o céu te proteja do orvalhos e dos assassinos.

Assim que disse estas últimas palavras, a voz apagou-se de repente, como se apaga uma vela quando a sopramos, e a estrada ficou mais escura do que antes.»


X

«Meu riso belo perdi!
No espelho o brilho morreu!
Traz-me de volta o meu riso.>

«Lentamente, a vida parecia retirar-se do seu corpo, fugindo por uma dessas fendas de que o homem se encontra coberto, no dizer de Terêncio, e, como a gazela ferida cujo pranto comoveu Maomé, aninhou-se sobre a bancada onde o pai carpinteiro o fizera nascer.

Do sofrimento de Pigmalião compadeceu-se Afrodite, fazendo despertar da frida peddra Galeita; mas ao infeliz boneco «o corpo fora-lhe dado apenas para que conhecesse a grande dor. Terá saudades do tempo em que era apenas uma marioneta...»

XI

No dia seguinte, depois de muito procurarem, os primos de Ângela irromperam em grande algazarra pelo refúgio dela.
O sol banhava o quarto. Parecia ter decorrido uma eternidade.
Com uma estranha amargura que nunca sentira antes, abraçou-os dizendo: "somos como uma linha enfiada: nunca nos separaremos."

XII

Enquanto entre risos e carícias beijava cada uma das crianças, os seus olhos fixaram-se na árvore em frente à janela do quarto, a qual, despojando-se das suas flores vermelhas, parecia verter lágrimas, tingindo de sangue o verde parque.
Na noite anterior, a trovoada destroçara a pobre árvore, que agora mais se assemelhava a um fantasma sem lugar, perdido na harmoniosa geometria do parque.
Na ferida que o raio rasgara no tronco, Ângela via, nitidamente, abraçados como um só corpo, o velho e o boneco, o pai carpinteiro e o filho, o rapaz e a sua Consciência, o Diabo, o grande teatro de fantoches e o «pedaço de madeira que ria e chorava como uma criança.»
Num sobressalto de felicidade, saiu correndo.

2.6.09

Hoje é dia 2.
Odeio dias pares.